Documento da Anvisa omite participantes de reunião sobre Covaxin

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Uma planilha da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que detalha as reuniões com representantes de produtores de vacina contra a covid-19 contém um espaço em branco: o campo para informar os nomes dos participantes da discussão sobre a Covaxin, produzida pela Índia.

A reunião ocorreu em 20 de janeiro deste ano entre a Precisa Medicamentos, intermediária do laboratório indiano no Brasil, e a Coordenação de Inspeção e Fiscalização Sanitária de Insumos Farmacêuticos, da Anvisa. O tema do encontro foi a “estratégia de certificação da Bharat Biotech, que produz a vacina Covaxin”.

Segundo o Ministério Público Federal, há indícios de crime no contrato para compra da Covaxin. O tema também está sob análise da CPI da Covid no Senado. De acordo com reportagem da Folha de S.Paulo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estuda cancelar o contrato.

O UOL solicitou a lista de participantes da reunião sobre a Covaxin à Anvisa, mas não recebeu resposta. O órgão também não explicou por que os nomes dos participantes não constam na planilha. As mesmas perguntas foram feitas ao Ministério da Saúde, que orientou que os questionamentos fossem encaminhados à Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto —que também não respondeu.

A planilha de reuniões da Anvisa foi disponibilizada em 11 de março, em resposta a pedido feito pela Lei de Acesso à Informação. Estão listadas 40 reuniões, de junho de 2020 a fevereiro de 2021.

Além da Covaxin, só a reunião da vacina russa Sputnik, em 2 de fevereiro, tem o campo de registro dos participantes em branco. Assim como a Covaxin, a Sputnik foi aprovada pela Anvisa apenas no início deste mês, mas com restrições. Já em uma das quatro reuniões feitas com a Fiocruz, em 24 de fevereiro, o campo de participantes consta como “sem informações”.

Em todas as outras 37 reuniões da planilha, o campo do nome dos participantes está preenchido.

Suspeitas no contrato com a Covaxin

O Brasil contratou 20 milhões de doses da Covaxin a US$ 15 cada. É o maior valor unitário negociado pelo governo. A vacina da Pfizer, por exemplo, que usa uma tecnologia mais avançada que a Covaxin, foi comprada pelo Brasil por US$ 10 e US$ 12 a dose. Já a CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan, custou menos de US$ 6 a dose.

A compra da Covaxin também é a única que foi feita por meio de intermediários, e não diretamente com o fabricante da vacina. O contrato foi assinado entre o governo brasileiro e a Precisa Medicamentos, que pertence à Global Gestão em Saúde e ao empresário Francisco Emerson Maximiano —que, por sua vez, também é sócio da Global.

A Global Gestão em Saúde é investigada por outro contrato firmado com o Ministério da Saúde, na gestão do então ministro Ricardo Barros (2016-2018), também investigado no caso. Hoje, Barros é deputado federal pelo Progressistas, e líder do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) na Câmara dos Deputados. A compra da Covaxin foi beneficiada por uma emenda de Barros na medida provisória que liberou importação de vacinas não aprovadas pela Anvisa.

A assinatura do contrato para compra da Covaxin foi rápida. Em 12 de janeiro, o laboratório indiano firmou parceria com a empresa brasileira. Em 25 de fevereiro, o contrato já estava assinado —antes mesmo da aprovação do imunizante indiano pela Anvisa. Servidor do Ministério da Saúde prestou depoimento dizendo que houve pressão para agilizar os documentos de venda da Covaxin no Brasil.

Além disso, as notas fiscais apresentadas pela Precisa Medicamentos ao Ministério da Saúde estão no nome de uma terceira empresa, a Madison Biotech, com sede em Singapura. Documentos acessados pelo UOL mostram que a Madison Biotech tem ligações com o laboratório indiano fabricante da Covaxin.