Homem consome salgadinho enquanto assiste propaganda de fast food na televisão
Comercial de hambúrguer, refrigerante e batata frita reforça o consumo de alimentos ultraprocessados no ambiente doméstico

A indústria de ultraprocessados copia estratégias da indústria do cigarro para impedir avanços em saúde pública. Indústria de ultraprocessados pode resultar em consequências graves. Estudo aponta uso de influenciadores, desinformação e lobby político para atrasar regulações essenciais.

A indústria que copia o cigarro: estratégias para sabotar a saúde

Estudo publicado pela BBC revela que a indústria de alimentos ultraprocessados adotou táticas semelhantes às utilizadas por empresas de tabaco. O objetivo é evidente: proteger lucros enquanto milhões de pessoas enfrentam doenças crônicas relacionadas à má alimentação. A indústria de ultraprocessados segue um padrão semelhante. Esse comportamento não é casual, mas parte de uma ação coordenada e sistemática.

Assim como os fabricantes de cigarro esconderam os riscos do tabagismo por décadas, as corporações alimentícias desacreditam pesquisas que associam seus produtos ao aumento de doenças como diabetes, obesidade e hipertensão. Para reforçar essa estratégia, a indústria de ultraprocessados financia estudos enviesados, contratam especialistas alinhados aos seus interesses e promovem confusão na opinião pública. Consequentemente, boa parte da população continua desinformada.

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Além disso, a influência digital reforça a naturalização desses produtos. Influenciadores contratados promovem snacks, biscoitos recheados e bebidas açucaradas como parte da rotina diária. Como muitos não informam o patrocínio, o conteúdo parece espontâneo, o que aumenta a eficácia da propaganda. Dessa forma, o consumo se fortalece, especialmente entre jovens e crianças, beneficiando a indústria de ultraprocessados.

Influência digital promove produtos prejudiciais

A indústria investe de forma agressiva em campanhas nas redes sociais. Enquanto pesquisadores alertam sobre os riscos dos ultraprocessados, influenciadores pagos divulgam esses produtos como inofensivos ou até benéficos. Essa prática engana o público, especialmente quando a publicidade aparece disfarçada de opinião pessoal.

Além disso, empresas monitoram e respondem críticas online com rapidez. Quando algum conteúdo viraliza questionando os malefícios de seus produtos, as marcas reagem com campanhas que tentam suavizar os impactos negativos. Essa ação, embora sutil, ajuda a manter o controle do debate público e a evitar perdas comerciais.

Lobby político enfraquece legislações protetivas

 Reunião entre empresários e políticos em sala de gabinete com pauta institucional
Líderes empresariais e representantes políticos discutem estratégias e acordos em ambiente formal

Enquanto isso, grupos empresariais atuam diretamente no Congresso e nos órgãos reguladores para bloquear leis de interesse público. Eles entregam documentos técnicos manipulados, convidam parlamentares para eventos e oferecem consultorias que favorecem sua visão de mercado.

Essas ações não apenas atrasam medidas de proteção, mas também impedem que o Brasil avance em práticas já consolidadas em outros países. Projetos que visam proibir mascotes em embalagens, restringir a publicidade infantil ou exigir rótulos mais informativos continuam paralisados por pressão do setor produtivo.

América Latina avança, mas Brasil ainda resiste

Países como Chile, Uruguai e México já adotaram leis rigorosas contra os ultraprocessados. Por exemplo, o Chile aplicou rótulos frontais com advertências visuais, baniu personagens infantis e restringiu horários de propaganda. Como resultado, o consumo de alimentos nocivos caiu e a consciência alimentar aumentou, enquanto o impacto da indústria de ultraprocessados diminuiu.

Em contrapartida, o Brasil ainda caminha de forma lenta. Embora instituições como Anvisa, Fiocruz e USP defendam a regulação, as propostas enfrentam forte resistência de grandes corporações e setores políticos aliados. A falta de avanços práticos compromete a saúde pública e aumenta os custos futuros com tratamentos de doenças evitáveis.

Autoridades alertam: o tempo está se esgotando

A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificaram os ultraprocessados como uma ameaça urgente à saúde global. Ambas recomendam que os países adotem políticas semelhantes às que reduziram o tabagismo a partir dos anos 1990.

Segundo especialistas, o Brasil precisa agir com firmeza. Regulamentar esses produtos não é apenas uma questão técnica, mas uma decisão de saúde pública. Enquanto o Estado posterga, a indústria avança e os impactos se agravam. Para mudar esse cenário, sociedade civil, imprensa e órgãos públicos devem agir de forma coordenada.

Fonte: BBC Brasil