Casal pode se divorciar sem precisar de separação judicial, decide STF

Ministros concordaram que o divórcio pode ocorrer diretamente, sem a necessidade de separação por tempo mínimo. Decisão terá repercussão geral, para todos os casos.

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Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, nesta quarta-feira (8), que a separação judicial não é um requisito prévio e necessário para que casais possam se divorciar.

O entendimento do STF se baseou em uma mudança feita na Constituição em 2010, que passou a prever o divórcio como meio de dissolução de vínculo de casamento.

Com isso, os ministros estabeleceram que “a separação judicial não é mais requisito para o divórcio, nem subsiste como figura autônoma”. Determinaram que “preserva-se o estado civil das pessoas que estão separadas judicialmente”. 

Prevaleceu a posição do relator, ministro Luiz Fux, no sentido de que, se o casal desejar, o divórcio pode ocorrer diretamente. Ou seja, sem a necessidade de etapas prévias, nem mesmo um período mínimo de matrimônio antes do fim do vínculo.

Os ministros decidiram ainda que a separação judicial não vai ser mantida na legislação brasileira como um mecanismo autônomo.

Neste ponto, o placar foi de 7 votos a 3. Os ministros que divergiram sustentaram que essa modalidade deveria persistir como uma medida a ser tomada pelos casais antes de uma decisão definitiva sobre o destino da união.

Votaram nesta linha os ministros Cristiano Zanin, Nunes Marques, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, o decano Gilmar Mendes e o presidente Luís Roberto Barroso.

Repercussão geral

O caso tem repercussão geral, ou seja, uma decisão do Supremo vai orientar o tratamento de outras disputas judiciais semelhantes em instâncias inferiores.

Quando a repercussão geral foi reconhecida, o ministro Luiz Fux, relator do caso, apontou que a mudança na Constituição gerou interpretações e posicionamentos diversos na Justiça.

“A alteração da redação constitucional ensejou interpretações variadas na doutrina e posicionamentos conflitantes no Poder Judiciário acerca da manutenção da separação judicial no ordenamento jurídico, bem como a respeito da exigência de se observar prazo para o divórcio”, ressaltou.

‘Casar é direito e não dever’

O caso começou a ser analisado no fim de outubro. Na ocasião, o relator considerou que uma mudança feita na Constituição em 2010 acabou com os requisitos para o fim do vínculo entre os casais, que incluíam obrigação de separação judicial por um tempo mínimo.

“O mesmo direito que as pessoas têm de constituir família elas têm o direito de dissolver o vínculo matrimonial”, afirmou o ministro.

Fux pontuou que a alteração no texto constitucional — que permitiu o fim do casamento diretamente pelo divórcio — simplificou os procedimentos, impedindo a criação de requisitos prévios.

“Essa nova introdução do poder constituinte derivado foi exatamente para não permitir que o legislador crie condicionantes para que haja o divórcio”, pontuou o relator. “Casar é direito e não dever, o que inclui manter-se ou não casado”, completou. 

Segundo o relator, a separação judicial também não é mais um mecanismo existente de forma autônoma na legislação brasileira, como uma espécie de etapa anterior a uma decisão definitiva dos casais.

Os ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Edson Fachin acompanharam na íntegra o voto do relator.

Divergência parcial

O ministro André Mendonça acompanhou em parte o entendimento de Fux. Assim como o relator, Mendonça considerou que o divórcio não demanda requisito prévio, mas entendeu que a separação judicial ainda existe.

“Entendo eu que a separação, enquanto instituto jurídico e instituto de fato, ela visa trazer um meio termo. Permitir um processo de caminhada paulatina, seja para uma consolidação definitiva, seja por vezes de uma retomada de relacionamento entre as partes envolvidas”, ponderou.

O ministro também lembrou que a mudança de entendimento na questão também tem impacto em direitos de herança, guarda dos filhos e direitos de propriedade.

Mendonça sustentou que a manutenção da separação judicial como instituição independente não permite a discussão de quem tem “culpa”.

O ministro Nunes Marques seguiu na linha de Mendonça, considerando que, apesar de o divórcio não precisar de requisito prévio, a separação judicial ainda é possível pela legislação brasileira.

Na retomada do julgamento nesta quarta, Moraes também se alinhou à posição de Mendonça neste ponto. Apesar de considerar a possibilidade do divórcio direto, ele entendeu que a separação judicial ainda existe de forma independente.

Os demais ministros, no entanto, votaram com o relator, formando o placar de 7 a 3 no tema.

Sessão

Na sessão desta quarta, o ministro Edson Fachin lembrou que, da mesma forma que casar é um ato de liberdade, a possibilidade de se divorciar também é um direito garantido aos casais.

“Casar é um ato de liberdade. É uma escolha. É um ato que constitui uma comunhão de vida. Manter-se casado também há de ser um ato de liberdade”. 

Em seu voto, o ministro Dias Toffoli lembrou os números de feminicídio no Brasil. Argumentou que ainda hoje o homem “acha que é dono do corpo da mulher”.

“Mesmo aquele namorado que é rejeitado, ele acha que existe direito subjetivo ao amor. Ele acha que é direito subjetivo de propriedade do corpo da mulher”, pontuou.

A ministra Cármen Lúcia citou a necessidade de garantir a liberdade na questão.

“Casar é um ato de liberdade, descasar também e não casar também. A liberdade é a única justificativa para que a gente tenha um direito democrático”, ponderou.

Histórico

Desde a mudança na Constituição de 2010, mencionada por Fux em seu voto, a separação prévia não vem sendo exigida. O texto do Código Civil, no entanto, não foi adequado e ainda estabelece regras expressas de separação.

Um de seus artigos prevê, por exemplo, que o casal poderá converter a separação em divórcio um ano após ela ter se tornado definitiva, por decisão judicial.

Outro trecho estabelece que o divórcio será solicitado pelo marido ou esposa caso comprovem “separação de fato por mais de dois anos”.