Gripezinha, cloroquina, país de maricas… Bolsonaro e Covid-19 duelam em 2020

Retrospectiva 2020: gestão do presidente contou com trocas no Ministério da Saúde, auxílio emergencial e guerra das vacinas

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O segundo ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi marcado pela pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2). O primeiro caso da doença no Brasil foi detectado no dia 26 de fevereiro  e, a partir de março, as medidas de prevenção começaram a ficar mais rígidas.

Deste ponto em diante, o país registrou um número expressivo de casos de infecção pela Covid-19 , enfrentoudificuldades econômicas , acompanhou os desentendimentos entre o governo federal e os governos estaduais e viu o comando do Ministério da Saúde mudar três vezes . Confira abaixo alguns dos principais momentos destacados pelo iG.

“Depois da facada, não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar, tá ok?” 

Em março , o presidente já adotava  a postura de negação em relação à pandemia de Covid-19 e aos desdobramentos que ela traria para o país. Em seus comunicados oficiais e em aparições públicas, Bolsonaro chamou medidas de prevenção ao novo coronavírus de “histeria” e reduziu a doença a uma “gripezinha” , dizendo que não enfrentaria problemas se fosse infectado, graças ao seu “histórico de atleta” . Além disso, ele apresentou a hidroxicloroquina como um medicamento para tratar a infecção, mesmo sem eficácia comprovada.

O presidente também teve atritos com o então Ministro da Saúde , Luiz Henrique Mandetta , por conta de diferentes posicionamentos quanto às medidas de precaução contra o vírus. Contudo, questionado sobre a possibilidade do Ministro ser demitido, Bolsonaro disse: “ Comigo, ninguém vai viver sob tensão. Está bem o Mandetta ”. 

“E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre” 

No começo de abril foi sancionado pelo Governo Federal  o auxílio emergencial de R$600 destinado a trabalhadores informais, microempreendedores individuais, contribuintes individuais da Previdência Social e desempregados.

Bolsonaro demitiu Mandetta  do Ministério da Saúde no dia 16 de abril, após divergências sobre as ações do governo frente à pandemia e, principalmente, a questão da cloroquina, defendida pelo presidente e desacatada pelo exministro .Nelson Teich assumiu o cargo e disse que haveria“alinhamento completo” com Bolsonaro.

Quando o Brasil ultrapassou o número de mortes da China, atingindo a marca de 5.017 mortos, Jair Bolsonaro foi questionado por uma repórter sobre o assunto e respondeu: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre ”.

“Quem é de direita toma cloroquina, quem é de esquerda, Tubaína” 

Alguns desdobramentos importantes da política brasileira aconteceram em maio , como a  segunda demissão de um Ministro da Saúde em meio à pandemia. Nelson Teich pediu para sair do cargo e fez o comunicado em público no dia 15 de maio, antes de completar um mês de atuação. Segundo o médico, não houve alinhamento com o presidente e por isso decidiu sair. “Não foi a cloroquina, foi política”, disse ele.

Nesse mês, já com  Eduardo Pazuello ocupando interinamente o posto de Ministro da Saúde,  o governo ampliou o uso da cloroquina em um protocolo que autorizava médicos a prescreverem o medicamento para pacientes com sintomas leves , mesmo com os possíveis efeitos colateraisque o remédio poderia causar. 

“A gente lamenta todos os mortos, mas é o destino de todo mundo”

No começo do mês de junho , o presidente disse que  estava estudando romper relações com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e definiu o órgão como partidário, ideológico e político. “Ou a OMS trabalha sem o viés ideológico ou nós vamos estar fora também. Não precisamos de gente lá de fora dando palpite na saúde aqui dentro”, comentou Bolsonaro.

O chefe de Estado também atribuiu a governadores e prefeitos a responsabilidade sobre o número de desempregono país, que, segundo ele, foi causado pelas medidas de contenção ao novo coronavírus.   

“Morre gente todos os dias de uma série de causas. É a vida, é a vida” 

Na primeira semana de julho , Bolsonaro foi diagnosticado com Covid-19 . O presidente se manteve isolado no Palácio da Alvorada e foi monitorado de perto pelo Hospital das Forças Armadas. Ele não teve complicações e se recuperou bem.

Bolsonaro sancionou a lei que determina o uso obrigatório de máscaras em público enquanto durar a pandemia no Brasil. No entanto, ele vetou o trecho que obrigava a utilização de máscaras em templos religiosos, estabelecimentos comerciais e instituições de ensino e não autorizou a imposição de multas para quem descumprisse as medidas. 

“Vamos tocar a vida e buscar uma maneira de se safar” 

No dia 8 de agosto , o Brasil atingiu a marca de  100 mil mortes por Covid-19. Já nesse mês, Bolsonaro dizia que avacina desenvolvida pelo laboratório AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford poderia estar disponível até dezembro para os brasileiros. Foi também em agosto que o Congresso derrubou vetos do presidente, assim garantindo acesso a água potável e materiais de higiene a indígenas e quilombolas e assegurando a obrigatoriedade do uso de máscaras.

No sexto mês de pandemia no Brasil , o chefe do Executivo sancionou a lei que libera escolas e universidades de cumprir 200 dias letivos em 2020  e a medida provisória que permite que o governo federal adote medidas para restringir a circulação de bens e pessoas. Bolsonaro também continuou a defender o uso da hidroxicloroquina e chegou a fazer  piadas de cunho sexual e homofóbico sobre aaplicação de ozônio no reto como método de tratamento contra o novo coronavírus.

“Estamos praticamente vencendo a pandemia”  

Após quatro meses comandando a pasta no posto de interino e cinco dias depois de o Brasil ultrapassar 130 mil mortos, o general Eduardo Pazuello tomou posse como ministro da Saúde em 16 de setembro . A cerimônia foi marcada pela crítica ao isolamento social e pela defesa da cloroquina. Nesse mês, o ex-ministro Mandetta declarou que o presidente teve uma “reação bem negacionista e bem raivosa” ao ser alertado sobre milhares de mortes que a pandemia poderia ocasionar.

Em setembro , Bolsonaro editou medidas provisórias para oficializar a entrada do Brasil no consórcio Covax Facilty , um programa mundial voltado para o desenvolvimento deimunizantes contra Covid-19. No mesmo mês, o presidente atacou as medidas de restrição adotadas por governadores e prefeitos, classificando-as como “projetos ditadores nanicos que apareceram pelo Brasil afora”.

“Eu não pedi para ninguém ficar em casa” 

Em outubro , o Brasil chegou a  150 mil mortos e a corrida por uma vacina ganhou novos capítulos. No dia 20 de outubro, Pazuello havia anunciado a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac , desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo. Em seguida, o ministro da Saúde foi desautorizado por Jair Bolsonaro.

O presidente também sustentou o discurso contra oisolamento social , medida recomendada pela OMS durante a pandemia, e rejeitou a ideia de uma vacinação obrigatória.

“Tem que deixar de ser um país de maricas” 

Em novembro , veio à tona a notícia de que  6,86 milhões de testes de Covid-19, adquiridos pelo Ministério da Saúde, estavam prestes a vencer nos próximos dois meses e poderiam ser descartados. Além disso, também foi o mês em que a guerra das vacinas se intensificou . “Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”, disse o presidente sobre a suspensão temporária dos testes da CoronaVac.

Com pelo menos 173 mil mortos , Bolsonaro declarou que “tudo agora é pandemia , tem que acabar esse negócio, pô” e afirmou que a população deveria deixar de ser “maricas” e “enfrentar” a Covid-19.  O presidente ainda negou que tenha usado o termo “gripezinha” para se referir à doença em qualquer momento durante a pandemia. 

“A pressa da vacina não se justifica” 

O Brasil chegou ao fim do ano, mas não ao final da pandemia, com os casos de infecção por Covid-19 crescendo novamente. No dia 16 de dezembro , o Plano Nacional de Imunização foi  apresentado oficialmente e, três dias depois, com pelo menos 186 mil mortes no país, Bolsonaro afirmou que “a pressa da vacina não se justifica”.

Foi também nesse mês que o presidente  editou uma medida provisória com R$ 20 bilhões destinados à compra de doses de vacina e insumos e ao financiamento de logística e campanha de imunização. Além disso, Bolsonaro também falou sobre planos de exigir um  termo de responsabilidadede quem tomar a vacina contra o novo coronavírus.