Lula é julgado no TRF4 com chances de ter processo do sítio anulado

Antes de entrar no mérito de sentença que condenou petista, desembargadores vão analisar se ele deveria ter sido ouvido por último no processo

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Um ano e dez meses depois de receber a condenação que lhe rendeu 580 dias de prisão na Operação Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva volta a ser julgado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. Desta vez, os desembargadores João Pedro Gebran Neto, Thompson Flores e Leandro Paulsen, da 8ª Turma da corte, analisam uma apelação do petista no processo do sítio de Atibaia.

Nesta ação, Lula foi condenado em primeira instância a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, no último mês de fevereiro, pela juíza Gabriela Hardt. Com o veto do Supremo Tribunal Federal à execução de pena em segunda instância, o ex-presidente não corre o risco de ser preso caso a condenação seja mantida. Entretanto, este resultado pode render um novo obstáculo ao exercício de seus direitos políticos, já que o petista estaria novamente enquadrado na Lei da Ficha da Limpa.

A recuperação plena do direito de disputar eleições depende de uma combinação de fatores: se o STF reconhecer a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condução do processo do tríplex do Guarujá e estender os efeitos deste entendimento a todas as ações que tiveram a participação atual ministro da Justiça — como é o caso do processo do sítio de Atibaia.

Antes de entrar no mérito da sentença, o TRF4 vai analisar a validade da decisão com base nos questionamentos feitos pela defesa sobre a ordem de apresentação das alegações finais pelos réus. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal anulou uma sentença de um processo da Lava Jato por entender que os réus que não são colaboradores devem apresentar defesa após seus delatores. Será a primeira vez que o TRF4 vai julgar um caso da operação com o recente entendimento do STF.

No processo do sítio, antes de apresentar as alegações finais a defesa de Lula chegou a pedir que pudesse enviar seus memoriais somente depois dos delatores. O pedido foi negado pela juíza da Lava Jato na primeira instância. “Não cabe fazer distinção entre acusados colaboradores e acusados não-colaboradores, outorgando vantagem processual a uns em detrimento de outros”, afirmou na ocasião a juíza Gabriela Hardt, que substituiu o ex-juiz Sergio Moro, que deixou a magistratura para se tornar ministro da Justiça do governo Bolsonaro.

O procurador regional da República Maurício Gotardo Gerum chegou a pedir que o TRF4 declare a nulidade do processo, e que ele volte à fase de alegações finais. “Não há diferença substancial entre o rito observado neste processo quanto à ordem de apresentação das alegações finais e aquele considerado pelo STF como ofensivo à Constituição em dois recentes precedentes”, justificou. Gerum, entretanto, ponderou mais tarde que a decisão do STF não abandonou a necessidade de o réu provar ter sido prejudicado pela ordem da apresentação das alegações finais e sustenta que o petista não demonstrou prejuízo.

Além da nulidade em relação à ordem de manifestação no processo, os advogados do ex-presidente argumentam que Hardt copiou trechos da sentença proferida por Sergio Moro no caso do triplex do Guarujá, o que também levaria à anulação da decisão. A magistrada admitiu ter utilizado o texto de Moro como base para escrever seu parecer, o que considera uma prática comum entre juízes, mas afirma ter julgado o caso com total isenção.

O julgamento da apelação de Lula chegou a ser suspenso, foi remarcado, e depois mantido por ordem do desembargador convocado do Superior Tribunal de Justiça Leopoldo Arruda. Nesta terça-feira, 26, ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, negou o pedido de liminar da defesa de Lula para suspender o julgamento.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) que rendeu a condenação em primeira instância, as construtoras Odebrecht, OAS e Schahin, esta última por intermédio do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, pagaram 1.020.500 reais em propina ao petista por meio das obras no sítio, propriedade do empresário Fernando Bittar e frequentado pelo ex-presidente e sua família. As reformas ocorreram entre dezembro de 2010, quando Lula estava prestes a deixar a presidência, e 2014.

A existência do sítio de Atibaia e das obras feitas na propriedade por empreiteiras envolvidas no petrolão foi revelada por VEJA em abril de 2015.

Decisão

Os três desembargadores podem determinar a nulidade da sentença da 13ª Vara e a volta do processo para a fase de alegações finais, ou entender que o caso do sítio não se enquadra na regra do STF e julgar o mérito do processo. Nesse caso, a condenação pode ser mantida com aumento ou redução da pena, ou revogada.

Lula foi condenado em segunda instância no mesmo tribunal em janeiro de 2018, no caso do tríplex do Guarujá. Na ocasião, a condenação do petista foi mantida e a pena aumentada pelos três desembargadores, que determinaram ainda o cumprimento imediato, após julgamento dos recursos que ele poderia apresentar ao TRF-4.

Com base nessa decisão, Lula foi preso em 7 de abril de 2018. Na ocasião, os membros da 8ª Turma usaram a Súmula 122 do tribunal, que foi pioneira no cumprimento provisório da pena em segundo grau e decisões dadas em 2017 do STF.

Desta vez, Lula mesmo que condenado, não pode ser preso. O STF mudou o entendimento em 7 de novembro e decretou inconstitucional a execução provisória da pena a partir do término do processo na segunda instância. Nesta terça-feira, o vice-presidente do TRF-4, desembargador Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, suspendeu, em decisão monocrática, os efeitos da Súmula 122, que permitia no tribunal as prisões após condenação.